terça-feira, 2 de março de 2010

Os segredos de Eli Gottlieb

Em entrevista à FOLHA, o escritor norte-americano comenta seu novo romance lançado no Brasil e defende que “tudo é autobiográfico na literatura”
Eli Gottlieb não está nada ansioso. Quanto ao filme que será baseado em seu novo livro, “O homem que você vai ver”, a maior expectativa do autor estadunidense resume-se ao dinheiro: “Espero apenas receber um cheque grande, agradável e que eu possa descontá-lo”, conta o escritor, em entrevista concedida por e-mail, de Boulder, Colorado, onde vive. O produtor Jeff Sharp, que já levou “Boy´s Don´t Cry” às telonas, adquiriu os direitos para filmar o último romance de Gottlieb, mas ainda não há previsão para o início das gravações.
Há dez anos atrás, Eli Gottlieb virou uma celebridade literária ao publicar sua primeira obra, “The boy who went away” (sem tradução para o português). O autor venceu o Rome Prize, foi condecorado pela Sociedade Britânica de Autores e seu primeiro livro ainda foi eleito como romance do ano pelo New York Times.
Fortemente autobiográfico, o enredo de “The boy Who went away” mostra Fad, um garoto autista, de 15 anos, que, por apresentar imprevisíveis momentos de violência, é internado pelos pais em uma instituição longe de sua família. A história é narrada pelo irmão mais novo de Fad, Denny, o alter ego do escritor.
Em sua segunda obra, “O homem que você vai ver”, lançada em 2008 nos Estados Unidos e em 2009 aqui no Brasil, Gottlieb surge com um delicado enredo policial. Na trama, o jovem escritor Rob Castor assassina sua ex-namorada com disparos de revólver e, depois, comete suicídio. Tal como Gottlieb, Castor também ganha fama ao publicar seu primeiro livro e vive um período em que não consegue escrever sua nova obra. Mas o livro não se resume apenas ao enredo policial.
Narrado pelo amigo de Castor, Nick Framingham, “O homem que você vai ver” é, na verdade, um livro sobre relações familiares. A perspectiva pessimista da vida em família, com mentiras, segredos, falsidades e infidelidades, é retratada conforme os mistérios da obra são revelados.
Seguindo uma forte tendência da literatura contemporânea, Eli Gottlieb, assim como os norte-americanos Phillip Roth e Paul Auster, e o sul-africano J. M. Coetzee, não abre mão da influência de sua própria vida ao compor suas histórias: “É o assunto que eu conheço melhor e com mais intimidade. Muitos escritores escrevem um primeiro livro fortemente autobiográfico e, em seguida, se afastam do tema. Mas há outros, como Phillip Roth, que, simplesmente, não conseguem ficar longe. Na literatura, tudo é autobiográfico, no sentido de que todos os personagens de uma obra são retirados do cérebro do autor”, afirma o escritor.
“O homem que você vai ver” foi classificado como “um triunfo”, pelo Los Angeles Times, e “irresistível”, conforme o New York Times Book Review. Um único pecado na obra: Eli Gottlieb não precisava ter investido no romance policial. Não que pareça deslocado ou até mesmo forçado. Mas a metamorfose do narrador e o emaranhado de segredos e traições já são o bastante para prender o leitor nessa viagem pelas veredas da amizade, dos relacionamentos amorosos e da condição humana.

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Título: O homem que você vai ver
Autor: Eli Gottlieb
Editora: Rocco
Preço: 36,00 (239 págs.)
Tradução: Maira Parula
Publicada na Folha de Londrina (18/02/2010).