sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A volta do Vampiro de Curitiba

Novo livro de Dalton Trevisan traz assassinos, estupradores, policiais corruptos e fetichistas sexuais em retratos cruéis e enxutos

Em uma época em que escritores vivem rotina de celebridade, com direito a mirabolantes noites de autógrafos, entrevistas em programas televisivos e badaladas conferências literárias, Dalton Trevisan é, antes de tudo, um peixe fora d’água.

O maior contista brasileiro não concede entrevistas há cerca de três décadas, possui apenas duas ou três fotografias imortalizadas em livros didáticos, não comparece a eventos nos quais é homenageado e caminha todos os dias pelas ruas de Curitiba. O cobiçado anonimato garante liberdade para o autor entrar em qualquer lugar, observar desconhecidos e pequenos detalhes de situações alheias, sem ser importunado por seus leitores.

Lançado no final de julho, “O maníaco do olho verde” reúne vinte e seis retratos estarrecedores, cruéis e realistas do submundo, composto por policiais corruptos, traficantes, assassinos, estupradores, prostitutas, alcoolatras e fetichistas sexuais. A prosa poética de Dalton Trevisan, extremamente piedosa com seus protagonistas e de forte crítica social, aproxima o leitor ao mundo da marginalidade, como se as personagens relatassem suas histórias e perspectivas em conversas triviais. Em “O maníaco de olho verde”, a sociedade escuta a voz ativa direto das entranhas da marginalidade.

Aos 83 anos, o “vampiro de Curitiba” recompõe criativamente sobre seus temas prediletos, como velhice e solidão, no excelente “Atira, velho!” e em “Mundo, não aborreça”, que traz o dramático e macabro leito de morte de Ceci.

Para muitas pessoas, Dalton Trevisan é difícil de ser “engolido”, devido a suas estórias recheadas de perversões sexuais. E sobre sexo, Dalton é mesmo insuperável, pois abusa, com maestria, da fórmula dos curtos e perturbadores enredos, como “O Padrasto”, narrado por uma jovem que é molestada pelo próprio padrasto. Na linha do trem, mais fetiches sexuais. O “maníaco” realiza seus ataques em três estórias inesquecíveis: “O assobio do maníaco”, “O maníaco ataca” e “O maníaco do olho verde”.

Poucos escritores dominam enredos tão enxugados e, ao mesmo tempo, tão complexos. Os contos curtos exigem leitores cuidadosos e críticos, que são conduzidos pelo ritmo descompassado da narrativa. Na concisão extrema, minuciosas psiques de anti-heróis são compostas em uma única frase. Portanto, apenas um suspiro ignorado, estrategicamente camuflado entre parágrafos ou frases, pode resultar na compreensão parcial do rico emaranhado psicológico construído por Dalton Trevisan, em sua nova obra-prima.

Publicada em O Diário do Norte do Paraná (14/09/08).

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